quinta-feira, 26 de maio de 2016

O Pan-óptico e a Vigilância Velada

 O Pan-óptico e a Vigilância Velada
Jeremy Bentham (1748 - 1832) foi um hedonista liberal inglês que proclamava a felicidade para todos graças ao livre mercado, mas que defendia o encarceramento num "panótico" (dispositivo que adequava uma vigilância absoluta e permanente) de todos os criminosos produzidos pela pauperização liberal. Sobre o "pan-ótico" de Bentham, há uma análise insuperável no livro "Vigiar e Punir" de Michel Foucault – Vigilância Velada.

Conhecido também pela planejamento do Pan-optismo, que corresponde à observação total, a tomada integral por parte do domínio disciplinador da vida de uma pessoa. Esse fato aconteceu em 1781, quando Bentham se preocupava com outra obra sua, Teoria dos Castigos e das Recompensas, publicada em francês, em 1811. Somente muito depois essa obra viria  em publicações inglesas, com títulos diferentes: O Fundamento Racional da Recompensa (1825) e O Fundamento Racional do Castigo (1830)
Em 1789, concebeu o Pan-óptico, que foi pensado como um projeto de prisão padrão para a reforma dos encarcerados. Mas, por vontade expressa do autor, foi também um plano modelo para todas as instituições educacionais, de assistência e de trabalho, uma solução econômica para as dificuldades da carceragem e o desenho de uma sociedade racional.
O nome aplica-se também a uma torre de observação localizada no pátio central de uma prisão, manicômio, escola, hospital ou fábrica. Pan-óptico é um termo utilizado para designar um centro penitenciário ideal desenhado pelo filósofo Jeremy Bentham em 1785. O conceito do desenho permite a um vigilante visualizar todos os prisioneiros sem que estes possam saber se estão ou não sendo observados.
 A estrutura da prisão incorpora uma torre de vigilância no centro de um edifício anelar que está dividido em celas. Cada uma destas celas compreende uma superfície tal que permite ter duas janelas: uma exterior para que entre a luz e outra interior dirigida para a torre de vigilância. Os ocupantes das celas se encontrariam enclausuradas umas das outras por paredes e sujeitos ao escrutínio coletivo e individual de um observador na torre que permaneceria oculto. Para isso, Bentham não só imaginou persianas venezianas nas janelas da torre de observação, mas também conexões sinuosas entre as salas da torre para evitar clarões de luz ou ruído que pudessem delatar a presença de um vigilante .
Aquele que estivesse sobre esta torre poderia observar todos os presos da cadeia (ou os funcionários, loucos, estudantes, etc), tendo-os sob seu controle .
De acordo com o design de Bentham, este seria um design mais barato que o das prisões de sua época, já que requer menos empregados.
.


O termo também é utilizado na obra Vigiar e Punir, de Michel Foucault, para tratar da sociedade disciplinar, e pelos teóricos das novas tecnologias, como Pierre Lévy e Dwight Howard Rheingold, para designar o possível controle exercido pelos novos meios de informação sobre seus usuários.
Nas páginas iniciais de Vigiar e Punir, um dos seus trabalhos deveras instigantes, o autor demonstra que, durante a Idade Média, na Europa, o suplício era uma ferramenta de punição dos criminosos levada ao extremo da sua aplicação. A dor, as blasfêmias nas vésperas da morte, enfim, uma vasta gama de sentimentos visíveis aflorava dos “culpados”, perante um público que poderia responder àquilo de formas distintas. No corpo dos torturados repousava um estilo penal, uma espécie de economia dos castigos, distribuída por todo o continente.  A supressão dos suplícios nos códigos de repressão e penalização, a inauguração de um novo período para a justiça penal, passava a ocorrer no final do século 18 e se concretizava em meados do século 19.
Nem por isso o francês oculta as deduções das relações de poder no corpo dos sujeitos, ao passo que elas o atravessam, o dirigem, o marcam. Noutras palavras, é possível vigorar um “saber” sobre o corpo que não expresse uma ciência sobre as suas particularidades, mas um modo de controle das suas forças, uma tecnologia política do corpo. “Trata-se de alguma maneira de uma microfísica do poder posta em jogo pelos aparelhos e instituições, mas cujo campo de validade se coloca de algum modo entre esses grandes funcionamentos e os próprios corpos com sua materialidade e suas forças” (FOUCAULT, 2010, p. 29). Por outro lado, a mudança acerca das modalidades penais fez direcionar não só para o corpo dos condenados o atributo da justiça.
 Acrescentou, sobretudo, o espírito, a alma aos sofrimentos humanos, e as punições adquiriram o sentido de regenerar os transgressores, não mais salientá-los ou aniquilá-los. Desde então as sociedades contemporâneas recebem o estatuto, conforme Foucault, de sociedades disciplinares.

Graças às técnicas de vigilância, a “física” do poder, o domínio sobre o corpo se efetuam segundo as leis da ótica e da mecânica, segundo um jogo de espaços, de linhas, de telas, de feixes, de graus, e sem recurso, pelo menos em princípio, ao excesso, à força, à violência. Poder que é em aparência ainda menos “corporal” por ser mais sabiamente “físico” (FOUCAULT, 2010, p. 171).
 A disciplina faz “funcionar” um poder relacional que se autossustentada por seus próprios maquinismos e substitui o brilho das manifestações pelo jogo ininterrupto dos olhares calculados.

Concluímos  com os estudos de Michel Foucault que as sociedades ocidentais modernas capitalistas se erigiram sob a égide do pan-optismo [no capítulo de Vigiar e Punir intitulado “O pan-optismo”, Foucault esboça o edifício arquitetural preparado por Jeremy Bentham (1785), o pan-óptico, por causa da eficiência quase absoluta e dos resultados que incutia nos sujeitos, como a imagem da constituição das sociedades disciplinares. Uma vez confinados nesse lugar, os internos nunca enxergariam os guardas que os cuidavam (se os cuidassem), e seriam sempre vistos de uma torre central de vigilância, isto é, cravadas pelas práticas de domínio e disciplina, portadoras da maior eficácia alcançável. O aparecimento dos meios de comunicação de massa acrescentou um potencial formidável nesse contexto. Qualquer habitante do planeta, provido de condições financeiras para adquirir equipamentos de filmagem, está apto a captar instâncias da vida tediosa e divulgá-las de acordo com as suas aspirações. Considerando as expectativas existentes, temos um contrassenso: num viés, a tal impunidade tão exasperada pode ser condenada, numa sociedade que contém instrumentos para controlar e fiscalizar, cada vez mais difundidos; no reverso, tamanha a tecnologia, o que nos concede a certeza de que não viveremos, no presente ou adiante, as agruras de Winston Smith, descritas por George Orwell na célebre literatura 1984, vigiados por um aparelho doméstico que tudo reporta ao “líder” da nação?

Nenhum comentário:

Postar um comentário